Sons Silenciosos
Silent Sounds
por Urmila Devi Dasi
Originalmente publicado em Back to Godhead [Volta ao Supremo], revista fundada por Sua Divina Graça Srila Prabhupada no ano de 1944 Artigo referente à edição do bimestre de setembro/outubro de 2008
É fácil imaginar como seria ser cego. O simples fechar dos olhos em um local relativamente escuro ou o caminhar por um ambiente às escuras pode nos dar a oportunidade de desenvolvermos empatia por aqueles que não podem ver. Tornar-se temporariamente surdo, entretanto, é algo quase impossível. Antes de mais nada, é difícil selar completamente a abertura dos ouvidos – colocar as nossas mãos sobre nossos ouvidos ou o uso de tampões de ouvido bloqueia o som apenas parcialmente. Além disso, muito do som é transmitido por meio dos ossos de nosso crânio, ignorando os ouvidos. A empatia de uma pessoa ouvinte para com um surdo, portanto, é limitada.
Meu interesse pelo mundo surdo é, possivelmente, diferente do interesse que tem a maior parte das pessoas ouvintes. A base da bhakti-yoga, como ensinada pelo movimento Hare Krsna, é ouvir e cantar o nome e as glórias do Senhor. Como os surdos-mudos poderiam fazê-los? Um dia, busquei a resposta desbravando o mundo do silêncio. Visitei quatro escolas para surdos em Indore, na Índia, a fim de ensinar as crianças sobre o Senhor Krsna.
“É este o trem? Qual vagão?”.
Nós quatro caminhamos pelo trem e finalmente chegamos a um vagão não-leito, onde fizemos o nosso desjejum. A cidade de Ujjain, a qual estávamos deixando, rapidamente se fez sumir de vista.
Os demais ocupantes do vagão fitavam-nos curiosos. Éramos os únicos trajando dhotis e sáris e exibindo marcas de tilaka na testa, indicando que somos devotos de Krsna. Três de nós também tínhamos a pele clara, o que costuma atrair alguns olhares na Índia. Mas não era a nossa aparência externa o mais fora do habitual; era o modo com que estávamos nos comunicando: em silêncio.
Os gestos que, em geral, complementam a fala haviam se tornado o meio integral. Um membro do nosso grupo, Dayal Gauranga Dasa, é surdo desde seu nascimento em uma família indiana no Reino Unido. Prema Pradipa Dasa, da Espanha, estava ali como seu intérprete. Kesava Bharati Dasa e eu estávamos acompanhando-os. Estávamos viajando para as escolas como “oradores” convidados. Como se daria o nosso ensinamento de bhakti com as crianças surdas que estávamos para visitar?
Dayal Gauranga e Prema Pradipa haviam recentemente tornado-se discípulos iniciados de Bhakti Caru Svami. Eles levam vida espiritual a surdos da Inglaterra há muitos anos (vide Volta ao Supremo 28/2, 1994). Eu tentei, com pouco sucesso, comunicar-me diretamente com Dayal Gauranga, e freqüentemente precisava me valer da ajuda de Prema Pradipa.
A Má Situação dos Surdos na Índia
Após cerca de duas horas de viagem, Gyanendra Puroit, o diretor de uma escola, pegou-nos na estação ferroviária. Ele nos explicou que a Índia possui a segunda maior comunidade de surdos do mundo, mas que poucos são treinados no uso da língua de sinais ou obtêm a chance de subsistirem por si mesmos. De fato, apenas cerca de dez por cento dos surdos indianos recebem alguma forma de educação especializada. A sua escola era uma das poucas que ensinam a crianças e adolescentes as habilidades que eles precisam para o mundo. Gyanendra Puroit queria a nossa ajuda para dar a eles também uma rica vida espiritual.
A maior parte dos que enchiam a sala eram garotos. A aparência atrativa deles, seu olhos alegres e suas expressões intensamente impacientes tomaram a minha atenção. Muitos destes estudantes tinham de viver na escola. Eu fui a primeira a falar, com o diretor traduzindo as minhas palavras para a língua de sinais.
Uma vez que eu freqüentemente viajo a países onde o inglês não é a língua nativa, estou acostumada a dar palestras traduzidas. Algumas traduções são simultâneas, o que requer grande habilidade por parte do tradutor. Em geral, os tradutores preferem trabalhar com frases ou seguimentos bem curtos, com o orador falando um pouco e eles então traduzindo. Para ensinar sob tais circunstâncias, a pessoa tem que manter sua linha de pensamento enquanto freqüentemente pausa e fragmenta idéias em pequenas “porções”. Quando aulas têm que ser traduzidas, tento dispor a sala de forma que as pessoas possam ver a linguagem corporal tanto do tradutor quanto a minha, dado que a linguagem corporal constitui aproximadamente setenta por cento da comunicação. Naturalmente, estes estudantes não podiam ouvir o tom da minha voz, o que perfaz cerca de vinte e três por cento de como entendemos e nos fazemos entender. Mas eu pensei: que eles, ao menos, possam ver minhas expressões faciais e gestos. Pensando dessa maneira, sentei-me bastante próxima ao tradutor.
Fixos no Tradutor
Eu estava prestes a ter uma surpresa. Quão pouco eu meditara no mundo da surdez! Toda a atenção deles tinha de estar centrada no tradutor, porque eles tinham que ler seus sinais, os quais, para mim, pareciam uma confusão de movimentos. Nem mesmo por um instante, eles podiam divergir sequer a menor porcentagem de atenção para mim.
Eu falei a eles sobre como não somos este corpo. Cada um de nós é uma alma que tem um corpo espiritual original com sentidos espirituais. Nossa cobertura corpórea restringe nossa habilidade de ver, ouvir e assim por diante. No corpo humano, todavia, a alma tem o recurso especial de poder despertar a natureza espiritual verdadeira, da mesma forma que águias têm habilidades especiais relacionadas à visão, e cachorros têm um olfato extraordinário. Embora a prática de bhakti-yoga tivesse de ser feita sob medida para suas restrições corpóreas, expliquei que Krsna é completamente livre e pode revelar-Se completamente a qualquer um que se aproxime dEle com amor, independente de sua situação corpórea. Eu ficava imaginando quão revigorante devia ser para aqueles jovens entenderem, mesmo que teoricamente, que suas identidades verdadeiras nada têm a ver com seu corpo temporário.
Em seguida, descrevi como o Senhor Krsna é maravilhoso – Suas opulências, Sua natureza, Suas atividades. E expliquei como nos conectarmos com Krsna através de bhakti, a yoga do amor e da devoção. Considerando que o cantar do nome do Senhor seria muito difícil para eles, concentrei minha apresentação em alguns dos outros aspectos de bhakti, especialmente a lembrança do Senhor, a adoração a Ele e o serviço a Ele.
Os estudantes praticamente pularam para fazer perguntas, gesticulando tão rapidamente que pareciam explodir de entusiasmo.
“Por favor, conte-nos histórias de Krsna!”, eles pediam repetidamente.
Eu contei uma história após a outra, e a alegria deles iluminou a sala. Alguns fizeram detalhadas perguntas filosóficas. Eu fiquei impressionada com a grande inteligência deles e a sede que tinham por conhecimento espiritual.
Um Colega Toma a Palavra
Por fim, Dayal Gauranga “falou”. Embora formas imensamente diferentes de língua de sinais sejam usadas em diferentes países, ele domina muitas delas e conhece formas universais que ele pode usar em muitos locais. Algumas vezes, o diretor tinha de assisti-lo com particularidades do sistema indiano, mas, na maior parte, ele podia sinalizar diretamente com os estudantes.
Como estavam felizes! Ali estava um deles, alguém que os compreendia e havia seriamente adotado uma prática espiritual baseada, em sua maior parte, no som. Enquanto Dayal Gauranga sinalizava sua apresentação, Prema Pradipa traduzia os sinais em inglês falado para Kesava Bharati e para mim. Vivemos tão fora de seu intercâmbio visual quanto eles viveram fora do nosso verbal.
Então, outra surpresa: Dayal Gauranga os fez ficarem de pé e cantarem o mantra Hare Krsna com ele. Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare/ Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Ele fez isso com o estabelecimento de um sinal específico para cada uma das três palavras: Hare, Krsna e Rama. Repetidamente, todos “cantaram” o mantra com suas mãos e olhos. Normalmente, o cantar em grupo, kirtana, é um sonoro e doce misturar de vozes e instrumentos nos conectando com o Senhor Supremo enquanto Ele Se manifesta por meio do som. Neste kirtana, contudo, não havia tambores, não havia címbalos, não havia harmônio. Na verdade, não havia som algum. O Senhor, no entanto, presente em Seu nome, estava palpavelmente presente naquela assembléia.
Em seguida, visitamos as outras três escolas, duas das quais tinham crianças com dificuldades mais severas do que a primeira. Uma escola cuidava dos miseráveis, e a outra cuidava tanto de crianças surdas como de crianças cegas. Nosso guia me disse o quanto os quatorze milhões de surdos da Índia valorizam livros de ilustrações, e como seus estudantes anseiam ter tais livros, em inglês, sobre como o Senhor Krsna é maravilhoso.
O Cantar dos Surdos
No trem de volta a Ujjain, pedi a Dayal Gauranga para me explicar como ele canta o mantra Hare Krsna em seu voto como discípulo. Quando membros da ISKCON se tornam discípulos de um guru, eles prometem se abster de sexo ilícito, intoxicação, jogos de azar e consumo de carne. Eles também fazem o voto de cantar o mantra Hare Krsna em cada uma das 108 contas, dando uma volta completa pelas contas, no mínimo, dezesseis vezes ao dia.
Dayal Gauranga tem quatro métodos de canto, e ele alterna entre eles a fim de manter sua mente focada. O primeiro é a visualização dos gestos manuais para cada palavra do mantra. O segundo é a visualização das palavras impressas do mantra. O terceiro é a visualização da forma do Senhor como a Deidade adorável; “Hare” é Radharani, e “Krsna” e “Rama” são Krsna. Seu quarto método é formar as palavras com sua boca e focar-se no que sente sua boca em cada palavra.
Quando experimentei seus métodos, vi-me automaticamente também verbalizando os sons do mantra, quer em voz alta, quer em minha mente. Era muito difícil meditar apenas na visão ou na sensação sem o som. Era também muito devagar.
“A princípio”, Dayal Gauranga sinalizou, “eu levava, pelo menos, meia hora para terminar uma volta de 108 contas”.
Pessoas ouvintes levam, em geral, entre cinco e sete minutos para o mesmo.
“Após muitos anos, com crescente prática e concentração, fui capaz de reduzir o tempo para vinte minutos por volta. Muitos anos depois, consegui a média de quinze minutos, que é o quanto levo atualmente”. Devido à sua situação pouco comum, seu voto é de, no mínimo, quatro voltas ao dia, embora ele continuamente tente cantar mais.
Ouvintes talvez considerem que tais métodos de meditação mântrica não são verdadeiramente, no sentido técnico, ouvir e cantar. Todavia, Krsna, Ele que compreende todas as línguas e pode ouvir com qualquer um de Seus sentidos, certamente aceita o serviço sinceramente oferecido de acordo com a capacidade de cada um. Além disso, Prabhupada nos informa que o mantra retratado em letras também é Krsna. Finalmente, podemos observar na prática que as pessoas surdas que aderem ao cantar estão se tornando purificadas e alentadas espiritualmente.
Nós talvez freqüentemente consideremos, enquanto queremos vida espiritual, que as práticas são excessivamente árduas. Contudo, aqui está alguém com razões para apresentar desculpas, mas que não o faz. Seu rosto brilha com a felicidade de sua dedicação condizente com seu desejo de ajudar as pessoas surdas a encontrarem profunda satisfação espiritual. Ele tem a fortuna de possuir o amor de seu irmão, de sua cunhada e de seu sobrinho, todos dedicados e gentis devotos de Krsna. Ele também tem o apoio do templo Hare Krsna de Londres, o Bhaktivedanta Manor.
De modo geral, poucos ouvintes sabem do profundo desejo de muitos surdos de obterem respostas para os problemas da vida a partir de uma plataforma espiritual. Como Krsna me demonstrou incontáveis vezes e de várias maneiras diferentes, aqueles que freqüentemente considero terem menos do que eu são os que, na verdade, possuem muito mais.
Meu interesse pelo mundo surdo é, possivelmente, diferente do interesse que tem a maior parte das pessoas ouvintes. A base da bhakti-yoga, como ensinada pelo movimento Hare Krsna, é ouvir e cantar o nome e as glórias do Senhor. Como os surdos-mudos poderiam fazê-los? Um dia, busquei a resposta desbravando o mundo do silêncio. Visitei quatro escolas para surdos em Indore, na Índia, a fim de ensinar as crianças sobre o Senhor Krsna.
“É este o trem? Qual vagão?”.
Nós quatro caminhamos pelo trem e finalmente chegamos a um vagão não-leito, onde fizemos o nosso desjejum. A cidade de Ujjain, a qual estávamos deixando, rapidamente se fez sumir de vista.
Os demais ocupantes do vagão fitavam-nos curiosos. Éramos os únicos trajando dhotis e sáris e exibindo marcas de tilaka na testa, indicando que somos devotos de Krsna. Três de nós também tínhamos a pele clara, o que costuma atrair alguns olhares na Índia. Mas não era a nossa aparência externa o mais fora do habitual; era o modo com que estávamos nos comunicando: em silêncio.
Os gestos que, em geral, complementam a fala haviam se tornado o meio integral. Um membro do nosso grupo, Dayal Gauranga Dasa, é surdo desde seu nascimento em uma família indiana no Reino Unido. Prema Pradipa Dasa, da Espanha, estava ali como seu intérprete. Kesava Bharati Dasa e eu estávamos acompanhando-os. Estávamos viajando para as escolas como “oradores” convidados. Como se daria o nosso ensinamento de bhakti com as crianças surdas que estávamos para visitar?
Dayal Gauranga e Prema Pradipa haviam recentemente tornado-se discípulos iniciados de Bhakti Caru Svami. Eles levam vida espiritual a surdos da Inglaterra há muitos anos (vide Volta ao Supremo 28/2, 1994). Eu tentei, com pouco sucesso, comunicar-me diretamente com Dayal Gauranga, e freqüentemente precisava me valer da ajuda de Prema Pradipa.
A Má Situação dos Surdos na Índia
Após cerca de duas horas de viagem, Gyanendra Puroit, o diretor de uma escola, pegou-nos na estação ferroviária. Ele nos explicou que a Índia possui a segunda maior comunidade de surdos do mundo, mas que poucos são treinados no uso da língua de sinais ou obtêm a chance de subsistirem por si mesmos. De fato, apenas cerca de dez por cento dos surdos indianos recebem alguma forma de educação especializada. A sua escola era uma das poucas que ensinam a crianças e adolescentes as habilidades que eles precisam para o mundo. Gyanendra Puroit queria a nossa ajuda para dar a eles também uma rica vida espiritual.
A maior parte dos que enchiam a sala eram garotos. A aparência atrativa deles, seu olhos alegres e suas expressões intensamente impacientes tomaram a minha atenção. Muitos destes estudantes tinham de viver na escola. Eu fui a primeira a falar, com o diretor traduzindo as minhas palavras para a língua de sinais.
Uma vez que eu freqüentemente viajo a países onde o inglês não é a língua nativa, estou acostumada a dar palestras traduzidas. Algumas traduções são simultâneas, o que requer grande habilidade por parte do tradutor. Em geral, os tradutores preferem trabalhar com frases ou seguimentos bem curtos, com o orador falando um pouco e eles então traduzindo. Para ensinar sob tais circunstâncias, a pessoa tem que manter sua linha de pensamento enquanto freqüentemente pausa e fragmenta idéias em pequenas “porções”. Quando aulas têm que ser traduzidas, tento dispor a sala de forma que as pessoas possam ver a linguagem corporal tanto do tradutor quanto a minha, dado que a linguagem corporal constitui aproximadamente setenta por cento da comunicação. Naturalmente, estes estudantes não podiam ouvir o tom da minha voz, o que perfaz cerca de vinte e três por cento de como entendemos e nos fazemos entender. Mas eu pensei: que eles, ao menos, possam ver minhas expressões faciais e gestos. Pensando dessa maneira, sentei-me bastante próxima ao tradutor.
Fixos no Tradutor
Eu estava prestes a ter uma surpresa. Quão pouco eu meditara no mundo da surdez! Toda a atenção deles tinha de estar centrada no tradutor, porque eles tinham que ler seus sinais, os quais, para mim, pareciam uma confusão de movimentos. Nem mesmo por um instante, eles podiam divergir sequer a menor porcentagem de atenção para mim.
Eu falei a eles sobre como não somos este corpo. Cada um de nós é uma alma que tem um corpo espiritual original com sentidos espirituais. Nossa cobertura corpórea restringe nossa habilidade de ver, ouvir e assim por diante. No corpo humano, todavia, a alma tem o recurso especial de poder despertar a natureza espiritual verdadeira, da mesma forma que águias têm habilidades especiais relacionadas à visão, e cachorros têm um olfato extraordinário. Embora a prática de bhakti-yoga tivesse de ser feita sob medida para suas restrições corpóreas, expliquei que Krsna é completamente livre e pode revelar-Se completamente a qualquer um que se aproxime dEle com amor, independente de sua situação corpórea. Eu ficava imaginando quão revigorante devia ser para aqueles jovens entenderem, mesmo que teoricamente, que suas identidades verdadeiras nada têm a ver com seu corpo temporário.
Em seguida, descrevi como o Senhor Krsna é maravilhoso – Suas opulências, Sua natureza, Suas atividades. E expliquei como nos conectarmos com Krsna através de bhakti, a yoga do amor e da devoção. Considerando que o cantar do nome do Senhor seria muito difícil para eles, concentrei minha apresentação em alguns dos outros aspectos de bhakti, especialmente a lembrança do Senhor, a adoração a Ele e o serviço a Ele.
Os estudantes praticamente pularam para fazer perguntas, gesticulando tão rapidamente que pareciam explodir de entusiasmo.
“Por favor, conte-nos histórias de Krsna!”, eles pediam repetidamente.
Eu contei uma história após a outra, e a alegria deles iluminou a sala. Alguns fizeram detalhadas perguntas filosóficas. Eu fiquei impressionada com a grande inteligência deles e a sede que tinham por conhecimento espiritual.
Um Colega Toma a Palavra
Por fim, Dayal Gauranga “falou”. Embora formas imensamente diferentes de língua de sinais sejam usadas em diferentes países, ele domina muitas delas e conhece formas universais que ele pode usar em muitos locais. Algumas vezes, o diretor tinha de assisti-lo com particularidades do sistema indiano, mas, na maior parte, ele podia sinalizar diretamente com os estudantes.
Como estavam felizes! Ali estava um deles, alguém que os compreendia e havia seriamente adotado uma prática espiritual baseada, em sua maior parte, no som. Enquanto Dayal Gauranga sinalizava sua apresentação, Prema Pradipa traduzia os sinais em inglês falado para Kesava Bharati e para mim. Vivemos tão fora de seu intercâmbio visual quanto eles viveram fora do nosso verbal.
Então, outra surpresa: Dayal Gauranga os fez ficarem de pé e cantarem o mantra Hare Krsna com ele. Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare/ Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Ele fez isso com o estabelecimento de um sinal específico para cada uma das três palavras: Hare, Krsna e Rama. Repetidamente, todos “cantaram” o mantra com suas mãos e olhos. Normalmente, o cantar em grupo, kirtana, é um sonoro e doce misturar de vozes e instrumentos nos conectando com o Senhor Supremo enquanto Ele Se manifesta por meio do som. Neste kirtana, contudo, não havia tambores, não havia címbalos, não havia harmônio. Na verdade, não havia som algum. O Senhor, no entanto, presente em Seu nome, estava palpavelmente presente naquela assembléia.
Em seguida, visitamos as outras três escolas, duas das quais tinham crianças com dificuldades mais severas do que a primeira. Uma escola cuidava dos miseráveis, e a outra cuidava tanto de crianças surdas como de crianças cegas. Nosso guia me disse o quanto os quatorze milhões de surdos da Índia valorizam livros de ilustrações, e como seus estudantes anseiam ter tais livros, em inglês, sobre como o Senhor Krsna é maravilhoso.
O Cantar dos Surdos
No trem de volta a Ujjain, pedi a Dayal Gauranga para me explicar como ele canta o mantra Hare Krsna em seu voto como discípulo. Quando membros da ISKCON se tornam discípulos de um guru, eles prometem se abster de sexo ilícito, intoxicação, jogos de azar e consumo de carne. Eles também fazem o voto de cantar o mantra Hare Krsna em cada uma das 108 contas, dando uma volta completa pelas contas, no mínimo, dezesseis vezes ao dia.
Dayal Gauranga tem quatro métodos de canto, e ele alterna entre eles a fim de manter sua mente focada. O primeiro é a visualização dos gestos manuais para cada palavra do mantra. O segundo é a visualização das palavras impressas do mantra. O terceiro é a visualização da forma do Senhor como a Deidade adorável; “Hare” é Radharani, e “Krsna” e “Rama” são Krsna. Seu quarto método é formar as palavras com sua boca e focar-se no que sente sua boca em cada palavra.
Quando experimentei seus métodos, vi-me automaticamente também verbalizando os sons do mantra, quer em voz alta, quer em minha mente. Era muito difícil meditar apenas na visão ou na sensação sem o som. Era também muito devagar.
“A princípio”, Dayal Gauranga sinalizou, “eu levava, pelo menos, meia hora para terminar uma volta de 108 contas”.
Pessoas ouvintes levam, em geral, entre cinco e sete minutos para o mesmo.
“Após muitos anos, com crescente prática e concentração, fui capaz de reduzir o tempo para vinte minutos por volta. Muitos anos depois, consegui a média de quinze minutos, que é o quanto levo atualmente”. Devido à sua situação pouco comum, seu voto é de, no mínimo, quatro voltas ao dia, embora ele continuamente tente cantar mais.
Ouvintes talvez considerem que tais métodos de meditação mântrica não são verdadeiramente, no sentido técnico, ouvir e cantar. Todavia, Krsna, Ele que compreende todas as línguas e pode ouvir com qualquer um de Seus sentidos, certamente aceita o serviço sinceramente oferecido de acordo com a capacidade de cada um. Além disso, Prabhupada nos informa que o mantra retratado em letras também é Krsna. Finalmente, podemos observar na prática que as pessoas surdas que aderem ao cantar estão se tornando purificadas e alentadas espiritualmente.
Nós talvez freqüentemente consideremos, enquanto queremos vida espiritual, que as práticas são excessivamente árduas. Contudo, aqui está alguém com razões para apresentar desculpas, mas que não o faz. Seu rosto brilha com a felicidade de sua dedicação condizente com seu desejo de ajudar as pessoas surdas a encontrarem profunda satisfação espiritual. Ele tem a fortuna de possuir o amor de seu irmão, de sua cunhada e de seu sobrinho, todos dedicados e gentis devotos de Krsna. Ele também tem o apoio do templo Hare Krsna de Londres, o Bhaktivedanta Manor.
De modo geral, poucos ouvintes sabem do profundo desejo de muitos surdos de obterem respostas para os problemas da vida a partir de uma plataforma espiritual. Como Krsna me demonstrou incontáveis vezes e de várias maneiras diferentes, aqueles que freqüentemente considero terem menos do que eu são os que, na verdade, possuem muito mais.
Tradução de Bhagavan dasa (DvS) – Outras traduções disponíveis em www.devocionais.xpg.com.br
Um programa de computar que pode ajudar os surdos ou pessoas com deficiência auditiva com o cantar está disponível no seguinte endereço eletrônico: http://www.dasya.com/%7Embest/freeware/misc.html.
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