quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Uma Chuva de Misericórdia: A Vida Exemplar de Bhakti-tirtha Swami


Uma Chuva de Misericórdia: A Vida Exemplar de Bhakti-tirtha Swami


Uma Chuva de Misericórdia: A Vida Exemplar de Bhakti-tirtha Swami

Rain of Mercy: The Exemplary Life of Bhakti-tirtha Swami

por Satyaraja Dasa

Artigo referente à edição do bimestre de novembro/dezembro de 2005

Rain of Mercy: The Exemplary Life of Bhakti-tirtha Swami

por Satyaraja Dasa

Bhakti-tirtha Swami (1950-2005), um dos meus amigos e mentores mais querido, foi uma pessoa de determinação singular, um pregador destemido e determinado da consciência de Krsna. Seu forte apego à missão de Srila Prabhupada levou-o a pregar ao redor de todo o mundo, especialmente na Europa Oriental, atrás da Cortina de Ferro, onde superou a todos em distribuição de livros de Srila Prabhupada; e na África, onde reis e rainhas reconhecerem-no como uma pessoa excepcional e um autêntico líder religioso. Seus feitos e comportamento exemplares também foram reconhecidos dentro da própria instituição de Prabhupada. Dentro da ISKCON, foi um respeitado sannyasi, monge na ordem de vida renunciada, e mestre espiritual com muitos discípulos pessoais. Ele foi o primeiro mestre espiritual Vaisnava afro-americano do mundo, e publicou inúmeros livros, entre outros temas, explicando como aplicar a consciência de Krsna no mundo moderno. Seus livros trabalham com a idéia empresarial de solução de conflitos e psicologia profunda, bem como alguns paralelos New Age. Incentivam o avanço espiritual através de técnicas de liderança centradas em princípios e realizações interiorizadas. Além disso, ele tinha uma incrível habilidade para tocar as pessoas de forma profunda, de mudar vidas; e milhares de irmãos espirituais, amigos e discípulos podem confirmar isso.

Os diversos nomes pelos quais Bhakti-tirtha Swami é conhecido na ISKCON falam um pouco sobre quem ele era. Eu gostava de conversar sobre isso com ele. Srila Prabhupada, por exemplo, deu a ele o nome de Ghanashyama Dasa, que significa “servo da nuvem negra”. O nome Ghanashyama se refere a Krsna, que tem uma compleição bela como uma nuvem negra de chuva. Eu costumava brincar com Bhakti-tirtha Swami que, ao lhe dar o nome de “Ghanashyama”, Prabhupada estava reconhecendo-o como um negro de grande carisma, um afro-americano com excepcionais qualidades materiais e espirituais. Ao que, ouvindo isso, claro, ele ria de sua forma peculiar, ou sorria belamente, expressando humildade, enquanto fazia um movimento com os braços afastando a idéia de ter alguma coisa em comum com Krsna ou alguma beleza visível, mundana ou de outro mundo.

Eu também apontava que “Bhakti-tirtha”, o nome que lhe foi dado em sua cerimônia de sannyasa, era também perfeitamente adequado a ele. Ele é como o verdadeiro tirtha, ou “local de peregrinação”, eu dizia, esses locais são como pontes para o mundo espiritual. A palavra tirtha é conceitualmente ligada a tirthankara, ou “construtor de pontes”, trazendo a idéia de que um verdadeiro local sagrado é como uma ponte para o reino espiritual, assim, os professores que ajudam as pessoas a chegarem a este reino são tirthas a sua maneira. Ele, especialmente, era uma ponte feita de bhakti, devoção, que levava, através dessa energia, as pessoas para Krsna. Daí “Bhakti-tirtha”.

Segundo diversos depoimentos, seu estilo de pregação da consciência de Krsna enfatizava a importância de se criar pontes, de forma que as pessoas em geral tivessem fácil acesso à filosofia. Devido ao seu grande senso de compaixão, trabalhou intensamente para conduzir o máximo de pessoas possíveis até os pés de Krsna. Por certo tempo, Bhakti-tirtha ficou conhecido dentro da ISKCON como Srila Krsnapada, que, mais uma vez, indica sua residência aos pés de Krsna e sua sempre-crescente capacidade de levar outros a esse mesmo abrigo. E, claro, ele era também um “swami”, que se refere a uma pessoa capaz de controlar seus próprios sentidos. Como veremos, sua vida como um devoto de Krsna revela essas qualidades em grande abundância.

John Serve Deus, e Deus Serve John

Bhakti-tirtha Swami nasceu como John Edwin Favors em 25 de fevereiro de 1950, o mais jovem de quatro irmãs e dois irmãos. Ele tinha um problema na fala que pensava que jamais iria superar. Outro obstáculo era que ele havia nascido em uma família muito pobre do subúrbio de Cleveland. Mas seus pais lhe deram boa formação, deram-lhe confiança, religiosidade e um senso de doação. Embora ele tivesse poucas roupas, por exemplo, sua mãe frequentemente as doava para garotos e garotas da vizinhança, esperando ensinar ao seu filho, assim, a importância da caridade. Ela também fazia muitas horas de serviço voluntário em igrejas locais, levando à sua família uma atmosfera de sacrifício.

John era uma criança evangelista. Embora o problema de sua fala tornasse algumas situações difíceis, ele falava melhor quando falando sobre tópicos religiosos. De alguma forma, sua gagueira diminuía enquanto compartilhava as palavras da bíblia sagrada e, em alguns anos, ela cessou, sendo possível percebê-la em raros momentos. Quando adolescente, ele regularmente aparecia no canal de TV local pregando no programa Christian Gospel.

“Porque eu tinha visto muita pobreza”, ele disse, “eu estava preocupado em fazer algo por mim e pelos outros”.

Ele demonstrou-se um excelente estudante na escola técnica de Cleveland, e usava boa parte de seu tempo livre fazendo trabalho altruísta.

Ele recebeu bolsa de estudos da Academia Hawken, uma escola preparatória de renome em Cleveland. Enquanto estudava lá, atraiu-se pelo movimento pelos direitos civis do Dr. Martin Luther King, e acabou por se tornar um líder local da causa. Apesar de seu envolvimento com as causas políticas, ou talvez por causa disso, ele se tornou um estudante exemplar.

Em 1968, suas notas excepcionais garantiram-lhe uma bolsa na universidade de Princeton, onde se formou em Psicologia e Estudos Afro-Americanos. Em Princeton, seus interesses políticos cresceram quando se juntou ao Black Panther Party, Student Noviolent Coordinating Committee e outros grupos ativistas. Foi eleito presidente do corpo estudantil em 1971 e presidente do órgão de políticas internacionais Third World Coalition em 1972.

Melvin R. McCray, um de seus colegas em Princeton, lembra-se dele como uma pessoa extraordinária. McCray escreveu no jornal semanal de Princeton:

“Eu vi John Favors pela primeira vez no primeiro encontro da Associação dos Acadêmicos Negros [ABC, Association of Black Collegians] no outono de 1970. Como presidente do ABC, ele fez um acalorado discurso sobre o papel dos negros em Princeton. Embora tivesse apenas 1,70 de altura, ele era uma figura imponente em seu tradicional dashika africano com estampa de leopardo, de bengala, cachimbo, cabelo black-power e barba. Ele chamava a si mesmo de Toshombe Abdul, e falava com a imponência e dinamismo de Malcolm X”.

Enquanto em Princeton, e também algum tempo depois de formado, John começou a trabalhar como coordenador assistente de direito penal na Secretaria de Defensoria Pública do estado de Nova Jersey. Ele também atuou como diretor em diversas clínicas de reabilitação para usuários de drogas e no Education Testing Service [espécie de ENEM dos Estados Unidos]. Apesar de todos os afazeres, ele mantinha um interesse pelo “cristianismo místico”, como ele se referia, e estudava com grande seriedade os temas espirituais. Isto não quer dizer que ele não tenha se envolvido com as atividades mundanas de seu tempo. Ele viveu, afinal, nos conturbados anos 60, com sua filosofia de sexo, drogas e rock 'n' roll. Relembrando sua juventude, ele disse: “Eu tentei ao máximo me esquecer de Deus. Mas, apesar de todos os esforços, eu sempre acabava O glorificando de alguma maneira”.

Ele estudou os ensinamentos de Sri Chinmoy, Swami Saccidananda e de um outro mentor menos conhecido, cujo nome ele nunca falou. Esse último mentor o direcionou para aquele que se tornaria seu mestre espiritual, Sua Divina Graça A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada. A princípio, todavia, ele estava relutante em aceitar Prabhupada e seus ensinamentos.

“A primeira vez que vi um Hare Krsna”, ele contou, “foi na Harvard Square durante uma partida de futebol. Fazia muito frio, e um grupo deles estava cantando próximo da quadra. Eu olhei para eles e pensei: ‘Isso é o cúmulo do absurdo’. Pensei que fossem estudantes brancos e ricos só curtindo e experimentando algum tipo de droga ou experiência alternativa. Mas, quando eu passei por ali novamente duas horas depois, eles continuavam cantando no mesmo lugar, mesmo estando muito frio. Eu entendi, então, que havia algo de diferente naquelas pessoas”.

Por fim, uma namorada lhe deu um álbum em que Srila Prabhupada cantava, chamado “Krsna Meditation”. Ouvindo atentamente ao guru que seu mentor dissera que ele reconheceria como seu eterno mestre espiritual, ele se lembrou de algo que há muito havia se esquecido: Ele era uma alma espiritual presa em um corpo material - não era nem negro nem branco - senão que era um ser espiritual. Ele chorou profusamente naquela noite.

Ele logo passou a freqüentar o templo Hare Krsna do Brooklyn, e, pouco tempo depois, renunciou o pouco que tinha para buscar com grande sinceridade a consciência de Krsna. Ele se mudou para o templo, onde os devotos seniores, vendo sua natureza intelectual e habilidade nata para dar aula, enviaram-no para Dallas, no Texas, para que ele ajudasse no jovem projeto Gurukula, uma escola destinada às crianças da ISKCON. Chegando lá, todavia, ele conheceu Satsvarupa Dasa Goswami, e o curso de sua vida mudou. Ele sentiu-se muito atraído pela forma simples e direta com que Satsvarupa Maharaja apresentava a consciência de Krsna e aceitou aquele devoto sênior como uma espécie de mestre espiritual instrutor. Naqueles dias, Satsvarupa estava começando um grupo de sankirtana viajeiro, um grupo de devotos que iriam viajar juntos distribuindo os livros de Srila Prabhupada. John imediatamente quis acompanhá-los.

O Nascimento de uma Bela Nuvem de Chuva
Logo se tornou evidente que John Favors não era apenas mais um devoto. Ele cantava, por exemplo, no mínimo trinta e duas voltas diárias do mantra Hare Krsna em suas contas, ao invés do padrão de dezesseis. Para isso, ele acordava mais cedo do que a maioria dos devotos e costumava ainda dormir mais tarde. Ele também mantinha um diário no qual escrevia uma carta para Srila Prabhupada todos os dias. Nessas cartas, ele revelaria suas fraquezas, pediria bênçãos para superá-las e expressaria sua determinação em tornar-se puro. Sua alimentação era bem reduzida, basicamente frutas e castanhas, às vezes algumas cenouras, bananas e um pouco de manteiga.

Inacreditavelmente, ele superou a todos os devotos que viajavam com ele – alguns com muita experiência – vendendo os livros de Prabhupada com a perícia de um comerciante profissional. Mais tarde, Hrdayananda Maharaja assumiria o grupo viajeiro. Ele treinou os jovens, especialmente Mahabuddhi Dasa e John, para que vendessem os livros de Srila Prabhupada para bibliotecas universitárias. A equipe ficou famosa na ISKCON como The Library Party, frisando a nova estratégia de pregação. John foi muito bem sucedido na distribuição de livros entre a elite intelectual.

Quando as semanas se tornaram meses, ele foi iniciado. Satsvarupa Maharaja o recomendou com a mais alta estima para Srila Prabhupada, que enviou uma carta em resposta no mês de fevereiro de 1973, dando a John o nome de Ghanashyama Dasa. Como a “nuvem negra de chuva” de Srila Prabhupada, ele amorosamente criou um novo padrão de chuva torrencial – uma tempestade de literatura espiritual.

Nos anos de 1974 e 1975, Srila Prabhupada escreveu várias cartas a Satsvarupa Maharaja e Rameshvara Maharaja, os mestres espirituais que instruíam Ghanashyama. Prabhupada ficou muito satisfeito e até mesmo impressionado com seu sucesso em distribuir livros. Prabhupada também escreveu diversas cartas pessoais a Ghanashyama durante esse período. Em uma carta, ele escreveu: “Você está apresentado um serviço de primeira qualidade para Krsna através de sua pregação. Aceite minhas bênçãos e continue se esforçando e Krsna muito em breve irá reconhecer todo o seu esforço”.

Tendo Kalakantha Dasa como seu associado, Ghanashyama foi então para a Europa, especificamente para a Inglaterra, para continuar com sua distribuição de livros. Todavia, o sucesso não foi muito grande. Como Kalakantha refletiria posteriormente: “Os ingleses, naquele tempo, pareciam relutantes pela conexão com a Índia. A Índia ainda era um tabu para eles”.

Algum tempo mais tarde, os dois compatriotas da ISKCON se separaram, com Ghanashyama indo para a Europa Oriental. Ele passaria a distribuir os livros de Prabhupada em países comunistas, nos quais, muitas das vezes, a religião era algo proibido ou objeto de grande censura. Ele levava sua vida consciente de Krsna de forma secreta e em condições austeras. Na Rússia, ele dormia em trens públicos, passando de um para outro durante a noite, e cantando suas voltas em banheiros públicos. Apesar de todas as adversidades, ele continuou muito bem sucedido, permanecendo entre os melhores distribuidores de livros para bibliotecas universitárias. Sua determinação e resultados positivos deram muito prazer a Srila Prabhupada.

Uma Chuva de Misericórdia

Quando Prabhupada estava doente, preparando-se para deixar este mundo no verão e inverno de 1977, ouvir sobre as proezas de Ghanashyama era uma das poucas coisas que lhe traziam grande entusiasmo. Diversas cartas de Tamal Krsna Goswami, secretário de Prabhupada naquele momento, descreviam o êxtase sem paralelo de Prabhupada ao ouvir sobre as atividades de Ghanashyama. Naturalmente, quando Prabhupada fez sua última viagem para o ocidente, à Inglaterra, Ghanashyama recebeu misericórdia especial na presença de Prabhupada. Ele chamou o jovem distribuidor de livros ao seu quarto, pediu para que ele se sentasse ao seu lado e lhe abraçou afetuosamente. Com lágrimas nos olhos, Prabhupada lhe disse: “Sua vida é perfeita”.

Mas sua “perfeição” não o fez se acomodar. Depois que Prabhupada deixou este mundo, Ghanashyama continuou distribuindo livros como um louco, servindo com grande entusiasmo à missão de seu guru. Com o passar do tempo, em New Vrndavana, Virgínia do Oeste, ele aceitou sannyasa de Kirtanananda Swami, recebendo o nome de Bhakti-tirtha Swami no ano de 1979. Em seguida, ele iniciou o Committee for Urban Spiritual Development [Comitê de Desenvolvimento Espiritual Urbano]. O projeto era algo próximo do seu coração; uma vez que, tendo sido ele mesmo uma criança da periferia, sabia dos interesses e queixas daquela classe e sabia também como atraí-las para a consciência de Krsna. Pregação na periferia, combinada com trabalhos altruístas e distribuição de prasadam, muitas vezes através da inauguração de restaurantes, tornou-se o foco de seus esforços. Seu restaurante em Washington D.F. foi um dos mais notadamente bem sucedidos.

Foi nesse contexto em que ele teve um sonho em que Srila Prabhupada lhe pedia para abrir a porta. No sonho, ele continuava fazendo outros serviços deixando o pedido de Prabhupada de lado. Por fim, após Prabhupada pedir mais uma vez e uma terceira vez, Bhakti-tirtha abriu a porta, e uma multidão de africanos entraram na sala. Por esse sonho, ele deduziu que Srila Prabhupada queria que ele fosse para a África, e assim, sem nenhuma inclinação especial por aquela parte do mundo, e no meio de um bem sucedido projeto em Washington, ele foi embora, de repente, com quase nenhum plano em mente.

Por fim, sua aventura pela África foi um gigantesco sucesso. Seus feitos na África, e em todos os lugares pelo qual passou, são muitos e muito grandiosos para serem descritos em detalhes aqui. Na África, ele abriu e supervisionou duas comunidades rurais e mais de vinte templos em seis países. Manteve também duas escolas públicas e pregou ao longo de todo o continente para as pessoas mais simples, especialmente na África do Oeste.

Talvez o seu maior feito na América tenha sido a fundação, em 1988, do Institute for Applied Spiritual Technology [Instituto de Tecnologia Espiritual Aplicada], dedicado a apresentar a consciência de Krsna para o público New Age ao redor do mundo. Um dos objetivos do instituto era estabelecer comunidades auto-suficientes, e, para tanto, ele rejuvenesceu o projeto Gita-nagari da ISKCON em Port Royal, Pensilvânia. Com esse projeto, o Swami chamou a atenção de personalidades influentes – renomados doutores, advogados e outros viram sinceridade em sua mensagem.

Alguns destaques de sua vida ilustre:

Algum tempo após aceitar sannyasa, foi para Jagannatha Puri e, embora ocidentais não possam entrar no templo, fez-se um arranjo pelo qual ele entrou para ver as belas deidades de Jagannatha.

Ele conheceu Mohammed Ali em 1981 e tornou-se um de seus conselheiros espirituais.

Tornou-se um membro do corpo governamental da ISKCON em 1982 e tornou-se mestre espiritual iniciador em 1985.

Ele foi para a África, onde Pushta Krsna Dasa, Brahmananda Dasa e outros estavam pregando, e abriu o país de uma maneira sem precedentes. Ele revesou sua estadia entre a África e a América por dezesseis anos, encontrando e trabalhando com os mais distintos dignitários do continente, celebridades e líderes, incluindo o Nobel da Paz Nelson Mandela.

Em 1990, foi honrado recebendo o título de Grande Líder em Warri, Nigéria, em reconhecimento de seu trabalho desinteressado na África. Ele ficou amplamente famoso, ao longo do subcontinente africano, como um líder religioso autêntico.

Enquanto se tornava cada vez mais conhecido internacionalmente como um líder espiritual, com diversas palestras em faculdades, canais de TV e de rádio, e com inúmeras conferências interreligiosas marcadas para os anos que viriam, o aspecto devastador do tempo se manifestou de forma inesperada, mudando seus planos para sempre.

Morrendo como Viveu

Bhakti-tirtha Swami foi diagnosticado com um melanoma em fase avançada (estágio quatro) em seu pé direito. Dez anos antes, ele havia sido avisado de um caroço suspeito naquele pé. Mas ele fora diagnosticado como benigno, e sua remoção significaria a perda de todo o seu pé. Mais tarde, em uma nova investida para removê-lo, os médicos descobriram que ele era maligno. O diagnostico de diabetes limitou as opções médicas. Primeiramente, ele tentou curas naturais, que demonstraram alguma ajuda no começo, mas que, por fim, ajudaram pouco.

Em agosto de 2004, os especialistas lhe informaram acerca da necessidade de imediata amputação do pé, quimioterapia e a remoção dos nódulos linfáticos infectados. Ele aceitou, mas quando lhe foi dito que a possibilidade de sucesso era mínima, começou a se preparar para deixar este mundo. Bhakti-tirtha viu tudo isso como uma oportunidade: “Krsna está me dando a oportunidade de desenvolver maior pureza, de rever o que precisa ser mudado; ele está ajudando a mim e a outros a vermos a vida espiritual como aquilo que merece toda a nossa atenção. Temos que estar prontos para servi-lO sob qualquer circunstância”.

De fato, a doença não veio para ele como uma surpresa. Ele orava frequentemente pedindo para que Krsna transferisse para ele os débitos dos outros, para que ele sofresse de forma que outros fossem aliviados de seus sofrimentos. Ele orara:

Querido Senhor,

Tudo aquilo que precisamos para sermos melhores servos da missão de Srila Prabhupada, deixe vir até nós. Tudo aquilo que precisa ser jogado fora para nos tornarmos puros no serviço a Srila Prabhupada, por favor, jogue fora.

Ele escreveu que estava desejoso de morrer pelas más ações dos outros, e que morrendo, de alguma forma, ele aproximaria seus amigos e irmãos espirituais. Isso foi o que de fato aconteceu. De acordo com Bhakti Caru Swami, outro líder da ISKCON e um amigo que teve muito contato com ele em seus últimos dias: “Maharaja [Bhakti-tirtha Swami] enfatizava que o sofrimento de tantos devotos havia se tornado algo insuportável para ele. Ele orava com muita intensidade para Srila Prabhupada querendo purificar-se, tornar-se um melhor discípulos, e ajudar aqueles que estavam sofrendo – a qualquer custo”.

Radhanatha Swami, um líder da ISKCON e um dos amigos mais queridos de Bhakti-tirtha Swami, fico constantemente ao seu lado pelos dois últimos meses como seu acompanhante. Outros também ficaram com Bhakti-tirtha Swami, incluindo discípulos que eram médicos. Amigos e bem-querentes apareciam aos montes, oferecendo apoio, procurando por bênçãos e oferecendo orações. Devotos de todo o mundo resolveram antipatias de longa data em seu nome.

Quando suas últimas semanas de vida começaram a se aproximar, sua consciência estava cada vez mais absorta em Krsna e ele entrou em uma meditação solitária, permitindo que apenas aqueles que falavam unicamente sobre Krsna estivessem com ele. No momento de sua partida, sua absorção era total. Ele ouvia apenas os passatempos de Krsna em Vrndavana e via apenas uma bela pintura de Krsna e uma de Prabhupada em frente à sua cama. Quando deixou seu corpo, ele estava segurando uma deidade salagrama sila, e outra estava próxima à sua cabeça. Espirrou-se água do sagrado Radha-kunda sobre ele, e um folhas de tulasi foi colocada em sua língua. Ele morreu como viveu: como um devoto exemplar.

Quando sua maravilhosa e produtiva vida estava chegando ao fim, ele e eu começamos a assinar as cartas que trocávamos com as palavras sânscritas aham tvam prinami: “Eu te amo”. Esse gesto assinalava nossa profunda apreciação pelo trabalho um do outro. Ele, por diversas vezes, expressou o apreço que tinha por meus livros, e sabia bem o quanto eu gostava dos seus. Mas não era só por isso. Ele e eu nos sentíamos como se fôssemos almas familiares em algum sentido transcendental. Nós dois aceitamos como missão apresentar a consciência de Krsna como ela é, e mostrar para os devotos, através de atos e palavras, que há diversas abordagens para a consciência de Krsna, que há mais de uma maneira de se servir o Senhor. Além disso, a nova maneira que encontramos de assinar nossas cartas mostra o tipo de pessoa que ele era, sempre pronto para expressar seu amor pelos outros devotos. Eu também te amo Bhakti-tirtha Swami, e você sempre estará em meu coração.



Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

sábado, 11 de agosto de 2012

O Festival de Nanda Maharaja


Em ocasião do Nandotsava, comemorado este ano no dia 10 de agosto.

O Festival de Nanda Maharaja





Palestra realizada em Hamburg, em 5 de setembro de 1973,

por Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada



Hoje é Nandotsava, uma ocasião muito fortunosa, porque, após o nascimento de Krsna, Maharaja Nanda, Seu pai, celebrou um utsava, uma cerimônia, e este dia se chama Nandotsava. Falarei um pouco sobre o Nandotsava. Nanda Maharaja era um pouco idoso quando Krsna nasceu, e alguns de seus amigos foram congratulá-lo: “Meu querido amigo, obtiveste um filho em tua idade avançada”, e Nanda Maharaja disse entre os amigos: “Como podem dizer que sou idoso? Um homem idoso não pode gerar um filho, logo sou jovem”. Estas descrições estão presentes no Srimad-Bhagavatam. Vrndavana é, como vocês devem saber, uma grande vila, e Nanda Maharaja é o líder da mesma, em virtude do que todos foram congratular a criança. Tal evento, como eu disse, chama-se Nandotsava.



Em conexão a isso, um brahmana falou um excelente verso: srutim apare smrtim itare bharatam anye bhajantu bhava-bhitah (Padyavali 126). Existem diferentes tipos de obras védicas: sruti, smrti, Mahabharata, Vedanta, mas o brahmana diz: “Que outros leiam o sruti, o Vedanta-sutra, os Upanisads e tantas outras obras védicas existentes. Que outro leiam tais composições, mas, no que diz respeito a mim, eu simplesmente vim para cá”. Aham iha nandam vande (idem): “Eu vim para cá a fim de adorar Nanda Maharaja”. Por que você deixou tudo e veio adorar Nanda Maharaja? Yasyalinde param brahma: “Eu o fiz porque, no pátio dele, a Suprema Personalidade de Deus está engatinhando. As pessoas estão buscando o que é Deus, e Deus está engatinhando no pátio dele. Diante disso, não encontro ninguém mais grandioso do que Nanda Maharaja, em razão do que ofereço meus respeitos a Nanda Maharaja”.



Este é o sentimento de um devoto. Em geral, aqueles que são seguidores do processo especulativo, ou jnana-marga, chegam, por fim, à compreensão de que são unos com a Suprema Verdade Absoluta: aham brahmasmi (Brhad-aranyaka Upanisad 1.4.10). O serviço devocional, não obstante, é tão excelente que o devoto não fica satisfeito em sentir-se uno com o Supremo, senão que, mediante o seu serviço, ele se torna maior do que o Supremo. Nanda Maharaja, por exemplo, não está ansioso por tornar-se uno com Deus, senão que ele se submeteu a tão grandes penitências que ele se tornou o pai de Deus. O devoto é tão grandioso que lhe é possível conseguir ter o Senhor Supremo como seu filho. É claro que isto se trata de uma ciência de conhecimento espiritual muito sutil para se entender.



De todo modo, hoje celebramos o Nanda-mahotsava. No Bhagavad-gita (4.6), é dito, ajo ’pi sann avyayatma bhutanam isvaro ’pi san: Embora Deus seja não nascido e seja o Supremo; Ele, por amor, aceita um de Seus devotos como Seu pai e advém como seu filho. Então, hoje é o excelente dia no qual Krsna apareceu. O Senhor Supremo apareceu como o filho de Nanda Maharaja.